Presente e Futuro

O PRESENTE E O FUTURO DA PESQUISA EM SÍNDROME DE DOWN

Ruy do Amaral Pupo Filho
Médico pediatra e sanitarista

 Em outubro de 1998 esteve no Brasil o Dr. Alberto Costa, cientista e pesquisador do Jackson Laboratory, dos EUA. A convite do Dr. Zan Mustacchi do CEPEC de São Paulo, o Dr. Costa fez palestras na capital e em Santos-SP.

O Dr. Alberto Costa é um jovem médico neurofisiologista brasileiro formado no Rio de Janeiro e que reside ha 10 anos nos EUA. Ha 3 anos, quando nasceu sua primeira filha, com a síndrome de Down (SD), o Dr. Costa mudou o foco de suas pesquisas em neurofisiologia para a área da SD. Em apenas 2 anos de trabalho ele se transformou em "um dos mais promissores e brilhantes cientistas de sua geração", nas palavras do Prof. Charles Epstein, eminente geneticista americano e também pesquisador da SD. Por seu trabalho ele já recebeu um importante prêmio do National Down Syndrome Society, entidade americana que financia pesquisas em SD.

O Jackson Laboratory, onde ele trabalha, é considerado o maior centro de pesquisas genéticas de camundongos do mundo e é o local onde foi desenvolvido um camundongo trisômico, que passou a servir de modelo animal para o estudo da SD. O entendimento de muitas doenças avança quando é possível estuda-las em animais, o que até ha poucos anos não era possível na SD. A pesquisa científica exige um grande número de animais para estudo e o que havia disponível eram alguns primatas que apresentam trissomias naturais. Mas as dificuldades na sua reprodução, devido entre outros fatores a seu longo tempo de gestação, impediam na pratica a realização das pesquisas.

Apesar de trissomias não ocorrerem naturalmente em roedores, é possível produzi-las em qualquer cromossomo do camundongo, através de um esquema apropriado de cruzamentos de linhas especiais. Camundongos com trissomia do cromossomo 16, que possui grande semelhança com o 21 humano, foram usados por quase duas décadas como modelos para a SD. Só que o camundongo trissômico morria logo após o parto. A equipe da Dra. Muriel Davisson do Jackson Laboratory conseguiu criar um camundongo que possui uma trissomia parcial deste cromossomo 6, compatível com a vida adulta. O camundongo chamado TS65Dn esta sendo agora amplamente utilizado nestes estudos.

Em 2 anos de trabalho no Jackson Laboratory a pesquisa realizada pelo Dr. Costa evoluiu para um total de 5 linhas, nas quais trabalha atualmente. São elas:

1. Investigação básica da neurobiologia do TS65Dn

2. Investigação dos fenótipos com relevância clínica potencial

3. Manipulação genética

4. Manipulação farmacológica

5. Fertilização in vitro do TS65Dn

As linhas de pesquisa 1 e 2, segundo o Dr. Costa, destinam-se a definir se de fato o TS65Dn é um bom modelo animal da SD, ou seja, se realmente ha uma correlação entre os acontecimentos nesses camundongos e no homem. Sabe-se que na SD as estruturas cerebrais são menores e que ha uma diminuição do número de neurônios. Nestes estudos ele esta interessado na neurotransmissão e na plasticidade em estruturas cerebrais críticas como córtex frontal, cerebelo, amígdala e núcleos amigdalianos e hipocampo (estrutura relacionada com a memória de curta duração). Ele esta particularmente interessado em estudar estruturas chamadas dendritos, responsáveis pela conexão entre os neurônios e relacionadas com a memória. Neles ocorrem 90% das fungues excitatárias neuroniais. Suas primeiras conclusões são de que o camundongo TS65Dn é um bom modelo animal para esta questão.

Em outra área das mesmas linhas 1 e 2, o Dr. Costa esta estudando uma função elétrica cerebral chamada "potenciação de longa duração" (LTP, em inglês) e varias formas de atividade elétrica sincronizada no sistema nervoso central. Se o camundongo for um bom modelo, a eficácia de medicamentos potencialmente poderá ser avaliada através da modificação dessas formas de atividade elétrica.

Na linha de pesquisa 3, da manipulação genética, o Dr. Costa estuda quais os efeitos causados pela introdução ou retirada de determinados genes do organismo do camundongo. Sempre correlacionando as alterações provocadas com as conseqüências sobre o organismo do animal.

A linha de pesquisa 4, de manipulação farmacológica, é com certeza a de maior interesse para os pais. Trata-se aqui de pesquisar medicamentos que sejam eficazes no tratamento dos efeitos da SD. O Dr. Costa pesquisa atualmente 8 tipos de drogas, de diferentes famílias farmacológicas. Dentre elas existem 2 em particular, nas quais o Dr. Costa deposita mais esperanças. Entretanto os estudos ainda são iniciais, e até que sejam comprovados seus efeitos e liberadas para uso humano um bom tempo ainda vai decorrer. Até lá, segundo o Dr. Costa, os nomes das drogas não podem ser liberados, por imposição dos laboratórios farmacêuticos produtores das mesmas.

Na linha de pesquisa 5, de fertilização in vitro, Dr. Costa pesquisa maneiras de acelerar a reprodução dos camundongos trissômicos, já que semelhança das pessoas com trissomia do 21, eles tem problemas de fertilidade. Nas fêmeas do camundongo a taxa de fertilidade é de cerca de 50% enquanto que nos machos a taxa de fertilidade é quase nula. Como é necessário um grande número de camundongos para a pesquisa e sua produção é cara o objetivo desta linha é baratear o custo e facilitar a realização das demais pesquisas. Com certeza trará também maiores conhecimentos sobre a função reprodutiva das pessoas com SD.

O balanço que se pode fazer a partir dos depoimentos do Dr. Costa é de que nos últimos 5 anos avançou-se muito e rápido na pesquisa em SD. Grandes vitórias já foram obtidas, como a criação do TS65Dn, chave para os avanços posteriores. Embora os primeiros resultados já estejam surgindo, os grandes avanços práticos ainda vão demorar um pouco. Seu trabalho também depende de outros, pois é realizado em equipe e em cooperação com outros cientistas de outros centros de pesquisa. Mas o Dr. Alberto Costa, por sua condição única de médico, cientista, pesquisador e pai, reúne todas as condições para desempenhar um papel fundamental na obtenção de uma terapia medicamentosa eficaz para a SD. Sabemos que normalmente as pesquisas são lentas, mas o tempo do Dr. Costa é diferente, é o tempo de um pai. A responsabilidade que pesa sobre seus ombros é enorme e a expectativa de todos e dele próprio, pode ser esmagadora. Esperamos que ele possa ter toda a inspiração, força, persistência, paz de espirito e serenidade necessárias para essa tarefa. A vitória será dele, de sua filha e de toda a Humanidade.

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